Justiça aponta paternidade socioafetiva para não anular adoção

A Justiça de Apiaí/SP julgou improcedente pedido de um homem que havia requerido a anulação do instrumento de adoção do filho de sua ex-companheira, sob a alegação de que a assinatura aposta no documento era falsa.

Após o término do relacionamento amoroso, o autor foi surpreendido com o recebimento de uma ação de prestação de alimentos, com cópia do documento contestado. Perícia judicial demonstrou que o autor não havia assinado o termo.

Para o magistrado Djalma Moreira Gomes Júnior, no entanto, a falta de autenticidade do instrumento de adoção é irrelevante. “A prova produzida nos autos dá conta de que o autor constituiu a paternidade socioafetiva em relação ao requerido, a qual, desde já ressalto, estabeleceu-se a par e independentemente do ato jurídico de adoção.”

Ele afirmou que as provas orais trazidas aos autos indicaram que o requerente e o menino se tratavam como pai e filho, inclusive publicamente.

  • Processo : 36/11

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36/11- Nulidade de Ato Jurídico- Adoção- J.P. X M.A.M.T.- Fls. 108/112- J.P., ajuizou a presente ação, pelo procedimento ordinário, declaratória de nulidade de ato jurídico consistente em adoção, em face de M.A.M.T., menor representado por sua genitora M.A.M.T.-.

É o relatório.

FUNDAMENTO e DECIDO.

Não há preliminares a apreciar. E, no mérito, o pedido é IMPROCEDENTE.

É que malgrado a prova pericial emprestada, produzida em processo crime respeitante aos mesmos fatos ora tratados (fls. 30/31), dê conta de que a assinatura aposta nos documentos constitutivos da adoção em tela não emanou dos punhos do autor, isso não basta para o acolhimento da pretensão.

Pois bem.

Verdade que os atos jurídicos em geral se sujeitam à anulabililidade e à nulidade, conforme, v.g., contaminados por determinados vícios de vontade ou vícios sociais. Nada obstante, a questão posta não se resolve com o manejo das normas respeitantes a esse tema. Isso porque, ao que se verifica, a prova produzida nos autos dá conta de que o autor constituiu a paternidade socioafetiva em relação ao requerido, a qual, desde já ressalto, estabeleceu-se a par e independentemente do ato jurídico de adoção.

E paternidade socioafetiva é assunção, de fato, do estado de pai, sem vínculo de sangue ou adoção, fundada no amor e no afeto, originando-se da circunstância de receber continuamente o tratamento de filho e de ser reconhecido pela sociedade com tal.

Nesse sentido, calha a lição de Belmiro Pedro Welter: A filiação afetiva também ocorre naqueles casos e que, mesmo não havendo nenhum vínculo biológico ou jurídico (adoção), os pais criam uma criança por mera opção, denominado filho de criação, (des)velando-lhe todo o cuidado, amor, ternura, enfim, uma família, cuja mola mestra é o amor entre seus integrantes; uma família, cujo único vínculo probatório é o afeto. (…) A despeito da ausência de regulamentação em nosso direito quanto à paternidade sociológica, a partir dos princípios constitucionais de proteção à criança (art. 227, da CF/1988), assim como da doutrina da integral proteção, consagrada na Lei 8.069/90 (especialmente arts. 4º e 6º), é possível extrair os fundamentos que, em nosso direito, conduzem ao reconhecimento da paternidade socioafetiva, revelada pela posse do estado de filho, como geradora de efeitos jurídicos capazes de definir a filiação (in Doutrinas Essenciais Família e Sucessões, Organizadores Yussef Said Cahali e Francisco José Cahali, Ed. RT, 2011, Vol. IV, p. 420).

No caso sob exame, como bem ressaltado pelo zeloso Doutor Promotor de Justiça, a informante Marlene (fls. 101) e a testemunha Cleide (fls. 102), ouvidas em juízo, foram uníssonas em dizer que o autor tratava e chamava o menor de filho, sendo recíproco tal comportamento. Informaram que mesmo após a separação do casal, o requerido ainda manifestava o interesse em ver o pai (fl. 106).

Deveras, asseverou M.A.M.: M. é filho apenas de M.. Quando José foi viver com M., passou a tratar M. com se fosse seu filho. Na época era uma criança bem pequena. M. chama o autor de pai, assim como esse o chamava de filho quando ainda morava com M. (fl. 101). Na mesma senda, a testemunha C.M.C. foi enfática: O autor tratava M. como se fosse filho dele. M. chama J. de pai. Já presenciei.

Igualmente, o autor chama o requerido de filho (fl. 102). E a prova oral foi roborada estudo social de fls. 20/21 que assentou que desde o seu nascimento, o réu foi cuidado pelo requerente como se fosse seu filho, sendo muito apegados um ao outro e mesmo sabendo que ele não é seu pai biológico, o garoto insiste em dizer que é, inclusive quando vai falar seu nome para alguém, acrescenta por conta própria o sobrenome do mesmo.

Assim, comprovada a paternidade socioafetiva do autor em relação ao réu e sendo esta irretratável tanto como o são a biológica e a decorrente de adoção, a exemplo do que estabelece o art. 48 do ECA , de rigor o desacolhimento da pretensão, independentemente da falsidade descoberta pela perícia de fls. 30/31, não se afigurando demais sobrelevar que a ninguém é dado desistir de ser pai.

Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido, extinguindo o feito com resolução do mérito e com fundamento no artigo 269, I, do CPC.

Arcará a parte autora com as despesas processuais e com os honorários advocatícios do réu que fixo em 20% (vinte por cento) sobre o valor atualizado da causa principal, observando-se o quanto prescrito no artigo 12 da Lei n. 1060/50. Int. Adv. JOSÉ FABIANO MORAIS DE FRANÇA-208881, EDSON LUIZ DE CAMPOS-106104.

Fonte: Migalhas

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Lançada campanha para estimular reconhecimento espontâneo de paternidade

“Não é apenas na certidão de nascimento que um Pai faz falta”. Com essa mensagem o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) lança, nesta quarta-feira (18/7), campanha para fomentar o reconhecimento voluntário de paternidade, que será veiculada em rádios e TVs brasileiras. A iniciativa faz parte do programa Pai Presente, realizado pela Corregedoria Nacional de Justiça, em parceria com os Tribunais de Justiça, para reduzir o número de pessoas que não possuem o nome do pai na certidão de nascimento. Estima-se que cerca de 5 milhões de estudantes estejam nessa situação no país, sendo 3,8 milhões menores de 18 anos, segundo dados do Censo Escolar 2009.

A campanha busca orientar mães pais e filhos sobre a importância e a facilidade de realizar o registro, mesmo que tardiamente. Em fevereiro deste ano, a corregedora nacional de Justiça, Eliana Calmon, publicou o Provimento 16, que facilitou o procedimento, permitindo às mães, cujos filhos não possuem o nome do pai na certidão de nascimento, recorrerem a qualquer cartório de registro civil do país para dar entrada no pedido de reconhecimento de paternidade. O mesmo procedimento pode ser adotado pelo pai que desejar espontaneamente fazer o registro do seu filho. O procedimento é gratuito.

A medida facilitou a vida de pessoas que moram em cidades onde não há varas ou postos de atendimento do Ministério Público, que antes precisavam se deslocar até a sede da comerca para iniciar um processo de investigação de paternidade. O objetivo da campanha é informar às pessoas sobre essa facilidade, mostrando a importância do registro para a vida e a formação dos filhos, sejam eles crianças, adolescentes ou maiores de 18 anos. Além do valor afetivo, o reconhecimento paterno assegura direitos legais, como recebimento de pensão alimentícia e participação na herança.

“O Conselho Nacional de Justiça sabe o quanto é importante para um filho ter o nome e a presença de um pai. Por isso, o reconhecimento de paternidade foi simplificado e agora pode ser feito em qualquer cartório de registro”, dizem as peças que compõem a campanha. Duas delas, voltadas para mães e pais, mostram a falta que faz à criança a figura do pai, no cotidiano e em sua formação. Uma terceira peça, voltada aos registradores civis, demonstra a importância e o papel desses profissionais que são a porta de entrada e o caminho mais curto para que famílias consigam obter o reconhecimento de paternidade ainda que tardio.

Como funciona o reconhecimento?
Com o Provimento 16, as mães podem procurar o cartório de registro civil mais próximo de sua residência para indicar o nome do suposto pai e dar início ao processo de reconhecimento. Para isso, basta preencher um termo com informações pessoais, do filho e do suposto pai, conforme modelo definido pela Corregedoria Nacional, além de apresentar a certidão de nascimento da criança ou do adolescente. Pessoas com mais de 18 anos que não têm o nome do pai na certidão também podem dar entrada no pedido diretamente nas serventias, sem a necessidade de estar acompanhadas da mãe.

O próprio registrador se encarregará de enviar o pedido ao juiz competente, que notificará o suposto pai a manifestar-se em juízo se assume ou não a paternidade. Confirmado o vínculo paterno, o magistrado determina ao oficial do cartório onde o filho foi originalmente registrado para que o nome do pai seja incluído na certidão. Caso o suposto pai intimado não compareça à Justiça no prazo de trinta dias ou negue a paternidade, o caso será remetido ao Ministério Público ou à Defensoria Pública, para seja iniciada ação judicial de investigação.

A regra também vale para os pais que desejam fazer o reconhecimento, os quais podem indicar o nome do filho ao cartório. Nesse caso, a mãe ou o filho maior de 18 anos serão chamados a manifestar-se e, confirmado o vínculo, o caso é remetido ao cartório onde a pessoa foi registrada ao nascer, para que seja incluído o nome do pai na certidão. Encontre o cartório de registro civil mais próximo de sua localidade. (www.cnj.jus.br/corregedoria/registrocivil).

Fonte: Conselho Nacional de Justiça

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Justiça não penhora imóvel comercial caracterizado como bem único de família

A 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul determinou que um imóvel comercial não seja penhorado em dívida de execução com o sistema bancário por considera-lo como bem único de família. A decisão foi unânime.

Caso – Mulher ajuizou ação em face do Banco Bradesco S/A requerendo que não recaísse sobre seu único bem, a ação de execução ajuizada pelo banco contra a autora. Segundo a autora o imóvel, que está alugado, é considerado bem de família, e é sua única fonte de renda e sustento.
Em sede de primeiro grau o pedido foi considerado improcedente, sendo o entendimento do juízo o fato da autora não residir no local e que o imóvel penhorado não é um bem de família, de acordo com a definição da Lei nº 8.009/90, a qual visa tutelar a dignidade da família, resguardando o direito à moradia.
Ao recorrer perante o TJ/RS a autora ponderou que mesmo tendo hipotecado o imóvel, o seu único bem de família não pode ser penhorado, já que o entendimento sobre o bem de família há tempos foi ampliado, reconhecendo como tal também aquele que provê o sustento da família.
Decisão – A desembargadora relatora do recurso, Liége Puricelli Pires, ao reformar a decisão salientou que mesmo com a comprovação de que a autora não reside no local, há certidão, firmada pelo Oficial de Justiça, de que o local está alugado, e que este fato não determina que o imóvel perca a qualidade de bem de família, se destinado a prover o sustento da autora e seus familiares.
Considerando que a propriedade estaria protegida pela impenhorabilidade, afirmou a relatora que, “assim, é de ser anulada a penhora realizada sobre o referido imóvel, seja porque se trata do único imóvel de propriedade da devedora, seja porque serve como fonte de renda.
Matéria referente ao processo (nº 70047594304).

Fonte: Fato Notório

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União estável. Companheiro falecido. Pensão por morte. Rateio entre companheira e esposa

UNIÃO ESTÁVEL. COMPANHEIRO FALECIDO. RECONHECIMENTO. SEPARAÇÃO DE FATO DO DE CUJUS COM A EX-ESPOSA. PROVA. PENSÃO POR MORTE. RATEIO ENTRE COMPANHEIRA E ESPOSA. POSSIBILIDADE. 1. Para o reconhecimento da união estável não é necessário que as partes estejam divorciadas ou separadas judicialmente, bastando que estejam separadas de fato. Inteligência do art. 1.723, §1º, do CCB. 2. Os efeitos jurídicos não decorrem do estado civil das partes, mas do fato da convivência marital, que exterioriza a natureza da relação, a qual deve ser duradoura, pública e contínua, com o propósito de constituir uma família. 3. Se o relacionamento entretido entre a autora e o de cujus assemelhou-se a um casamento de fato, indicando uma comunhão de vida e de interesses, com notoriedade, publicidade e affectio maritalis, inclusive com o nascimento de uma filha, imperioso é o reconhecimento da união estável. 4. Comprovada a união estável, a companheira está legitimada a se habilitar como pensionista do IPERGS, e deverá receber, juntamente com os filhos e a ex-esposa do falecido, a pensão previdenciária deixada em razão da sua morte. 5. A simples existência de vida comum demonstra a dependência econômica da companheira em relação ao de cujus, mormente quando dessa relação resultou prole. Recursos desprovidos.

APELAÇÃO CÍVEL: SÉTIMA CÂMARA CÍVEL
Nº 70 038 603 437: COMARCA DE CANELA
M.P.: . 001 – APELANTE/APELADO
M.R.C.: 002 – APELANTE/APELADO
I.P.E.R.G.S.: 003 – APELANTE/APELADO
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Magistrados integrantes da Sétima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, negar provimento aos recursos.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores DES. ANDRÉ LUIZ PLANELLA VILLARINHO E DR. ROBERTO CARVALHO FRAGA.
Porto Alegre, 23 de novembro de 2011.
DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES,
Relator.
RELATÓRIO
DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES (RELATOR)
Trata-se da irresignação da autora e dos réus com a r. sentença que julgou procedente em parte a ação de reconhecimento de união estável, cumulada com pedido de benefício previdenciário que M. P. move contra M. R. C. e o IPERGS – INSTITUTO DE PREVIDÊNCIA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, para o fim de:     a) declarar a existência de união estável entre M. P. e J. C. C., iniciada em maio de 2004 e terminada com o falecimento do convivente em 24.12.2006; b) condenar o IPERGS a conceder pensão por morte em favor da autora, a contar da data do óbito, com juros legais e correção monetária desde então, e em rateio com os demais dependentes, na forma da legislação previdenciária estadual e c) condenar os litigantes a arcar, cada um, com 1/3 das custas processuais e os honorários advocatícios, estes fixados em R$ 1.500,00, em favor dos patronos de cada um, permitida a compensação e suspensa a exigibilidade em relação à autora, por litigar sob o pálio da AJG.
Sustenta a recorrente M. P. que é dificílimo vislumbrar a manutenção do casamento entre o J. C. e M., pois o falecido residia em Canela com ela e a filha comum, trabalhavam juntos durante toda a semana, além de serem vistos juntos tanto em Caxias quanto em Canela, participando, inclusive de eventos sociais. Alega que M. não provou que mantinha vida conjugal com J. perante a sociedade. Aduz que a instrução processual foi ampla e não deixou dúvidas sobre a união estável, embora a intenção de M. de distorcer os fatos. Assevera que, pelas declarações prestadas, constatou-se que as testemunhas e M. mantinham relação de amizade, o que põe em dúvida a imparcialidade dos relatos. Refere que, ao viver em união estável com J., tornou-se economicamente dependente dele, pois juntos constituíram uma família e dividiam todas as despesas do lar e para a criação da filha. Afirma que, evidenciada a sua dependência econômica em relação ao falecido, deve receber a integralidade da pensão pela morte do seu companheiro, em concorrência com os filhos dele. Pede o provimento do recurso.
A recorrente M. sustenta que o pedido formulado pela autora é juridicamente impossível, em razão da higidez de seu casamento com o falecido. Alega que a relação havida entre seu marido e a autora não passou de um concubinato adulterino. Aduz que a relação adulterina configura um fato social, capaz até de gerar resultados jurídicos no plano do Direito das Obrigações, mas jamais poderá alcançar a categoria de fato jurídico inserto no plano do Direito de Família, no modelo puro de uma entidade familiar. Assevera que a legislação federal e de previdência, considera a esposa como beneficiária da pensão por morte. Refere que em momento algum a autora comprovou a separação de fato do de cujus, requisito primordial para o reconhecimento da união estável. Pretende seja julgada improcedente a ação. Pede o provimento do recurso.
Sustenta o INSTITUTO DE PREVIDÊNCIA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL que, não estando dissolvido o casamento do segurado, nem mesmo de fato, a autora não faz jus ao benefício previdenciário, pois não integra o conceito de companheira, previsto no art. 9º, inc. II, da Lei Estadual nº 7.672/82. Alega que a situação de dependência da requerente não é presumida, mas deve ser comprovada, o que inocorre no caso. Aduz que a autora é servidora pública estadual, investida no cargo de Escrivã Policial e percebe mais de R$ 1.000,00, valor suficiente para a sua mantença e que supera, em muito, o montante do salário mínimo. Pretende seja afastada a sua condenação ao pagamento de benefício de pensão por morte à autora. Pede o provimento do recurso.
Intimados, os recorridos apresentaram contra-razões, reprisando os argumentos expendidos em seus recursos e pugnando pelo desprovimento do apelo da parte adversa.
Com vista dos autos, lançou parecer a douta Procuradoria de Justiça opinando pelo conhecimento e desprovimento dos recursos.
Considerando que esta Câmara adotou o procedimento informatizado, friso que foi observado o disposto no art. 551, § 2º, do CPC.
É o relatório.
VOTOS
DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES (RELATOR)
Estou confirmando a douta sentença recorrida pelos seus próprios e jurídicos fundamentos.
Com efeito, lembro que é pacífico tanto na doutrina como na jurisprudência que, para o reconhecimento de uma união estável, não há necessidade de que as partes estejam divorciadas ou separadas judicialmente durante o tempo de convivência, bastando que estejam separadas de fato, pois o que não se admite, por contrariar o princípio da monogamia, é a convivência marital paralela. Ou seja, não se admite é que um dos conviventes seja casado e mantenha, paralelamente, uma união estável. Mas se no plano fático o casamento já se desfez, nada impede que o cônjuge separado de fato refaça sua vida familiar.
Aliás, nem mesmo a dicção da Lei nº 8.971/94 recebia interpretação literal, sendo que a orientação jurisprudencial dominante tratou sempre de proteger a família, valorizando a natureza da relação estável entretida. Ou seja, havendo a separação fática de quem eventualmente estivesse mantendo uma união estável, essa relação era mais importante do que a anterior, cuja existência se dá apenas no plano formal, em razão do remanescente vínculo conjugal.
Assim, a situação da separação fática é que sempre teve relevância, pois é inadmissível a concomitância de dois núcleos familiares, pois, como disse, estaria a violar o princípio da monogamia, que é informador do próprio Direito de Família.
No caso em exame, a ruptura da vida em comum entre o falecido e M. ficou cabalmente demonstrada, não se podendo falar em concubinato adulterino, nem refutar a união estável pretendida por M. com base no remanescente vínculo conjugal.
Extrai-se dos autos e das provas nele contidas que, quando ocorreu o óbito de J. C., o casamento dele com a recorrente M. já estava definitivamente rompido no plano fático. Portanto, não se verificava qualquer óbice legal para o reconhecimento da relação descrita na exordial como sendo união estável, sendo pacífica a orientação jurisprudencial desta Corte.
Oportuno lembrar, como mera ilustração, que nem mesmo o Código Civil vigente reconhece óbice no reconhecimento de união estável quando a pessoa casada estiver efetivamente separada de fato do cônjuge, como consta no §1º do art. 1.723, in verbis:
“A união estável não se constituirá se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente”.
É evidente que, se o casamento se mantivesse hígido, como um fato social, isto é, se o de cujus mantivesse vida em comum com a ex-mulher, haveria o impedimento legal para se reconhecer a nova entidade familiar. E, então essa união paralela não teria o condão de constituir entidade familiar (salvo numa hipótese de putatividade do que também não se cogita no caso em tela).
No caso, o relacionamento entretido entre a autora e o de cujus assemelhou-se em tudo a um casamento de fato, indicando uma comunhão de vida e de interesses, com notoriedade, publicidade e affectio maritalis, inclusive com o nascimento de uma filha, o que torna imperioso o reconhecimento da união estável.
Assim sendo, os efeitos jurídicos não decorrem do estado civil das partes, mas do fato da convivência marital, que exterioriza a natureza da relação, que deve ser duradoura, pública e contínua, com o propósito de constituir uma família. E a prova contida nos autos mostra que M. e J. C. viveram em união estável, sendo que residiam no mesmo endereço, usavam aliança de compromisso, eram reconhecidos como um casal pela sociedade de Canela e pelos colegas de trabalho e, inclusive, viajavam para Caxias do Sul juntos.
Além disso, consta nos autos as condolências enviadas à recorrida pela Câmara Municipal de Vereadores de Canela, em razão do falecimento do companheiro (fl. 33). E deve ser considerado também, que na data do acidente, o de cujus estava usando o carro da autora para viajar à Caxias.
De outra banda, destaco que a prova testemunhal igualmente autoriza a procedência da ação.
Ao serem ouvidos em juízo, L. R. (fls. 413/415), P. R. (fls. 416/419) declararam que J. C. estava separado de fato e tentando um acordo com M., sendo que viajava para Caxias do Sul a fim de visitar o filho G.
Segundo a testemunha S. (fls. 420), M. e J. C. viviam como marido e mulher e o filho dele tinha pleno conhecimento da situação. D. (fls. 422/423), testemunha residente em Caxias do Sul, afirmou que recebia o casal em sua casa e que saiam juntos, participando de eventos culturais que aconteciam na cidade.
Essas declarações também encontram alento na ampla prova documental acostada aos autos do processo, merecendo destaque as fotografias de fls. 80/100 e 304/308.
Portanto, tenho que os depoimentos das testemunhas K. (fls. 434/435), Á. (fls. 448/452), E. (fls. 453/457) e A. (fls. 458/460), restam isolados no contexto probatório.
Destaco, ainda, que as provas dos autos indicam que o falecido dirigia-se até Caxias do Sul aos domingos, a fim de encontrar com o filho, mas durante a semana coabitava diariamente com M. e a filha M. E.
Assim, como se infere da prova colhida nos autos, M. e J. C. mantiveram um relacionamento amoroso estável, que foi público e notório, ficando claramente configurada a affectio maritalis e, portanto, a existência de uma união estável entre o casal, relacionamento este que se assemelhava a um casamento, indicando uma comunhão de vida e de interesses, sendo apta para produzir seqüelas de ordem patrimonial albergadas na lei civil.
Por fim, comprovada a união estável entre a autora e o servidor falecido, tenho que M. está legitimada a ser habilitada como pensionista perante o IPERGS, recebendo juntamente com os filhos e a esposa do falecido, a pensão por morte em disputa, a teor do disposto nos artigos 9º e 10 da Lei Estadual nº 7.672/82.
Destaco, ainda, que a legislação estadual, ao restringir o direito da companheira a receber a pensão previdenciária, apenas quando o segurado for solteiro, desquitado, separado judicialmente ou divorciado, não se coaduna com a nova ordem constitucional trazida pela Constituição Federal de 1988, que, no seu art. 226, § 3º, elevou à condição de entidade familiar a união estável havida entre o homem e a mulher, passível de proteção do Estado, sem exigir o desimpedimento dos conviventes.
Da mesma forma, entendo que a simples existência de vida comum é suficiente para demonstrar a dependência econômica da autora em relação ao de cujus, mormente quando da relação resultou prole.
Nesse sentido é a jurisprudência desta Corte, como se vê dos seguintes julgados:
“APELAÇÃO CÍVEL E RECURSO ADESIVO. PREVIDÊNCIA PÚBLICA. PENSÃO POR MORTE. AÇÃO ORDINÁRIA. PEDIDO DE HABILITAÇÃO DA COMPANHEIRA COMO DEPENDENTE DO SEGURADO FALECIDO, PARA FINS DE PERCEPÇÃO DE METADE DA PENSÃO POR MORTE. UNIÃO ESTÁVEL. DIREITO DA COMPANHEIRA À PENSÃO POR MORTE, COMPROVADA A EXISTÊNCIA DE UNIÃO ESTÁVEL, POR LONGO PERÍODO, ENTRE A AUTORA E O SEGURADO FALECIDO. RATEIO DA PENSÃO, EM PARTES IGUAIS, ENTRE A ESPOSA E A COMPANHEIRA. APLICAÇÃO DO ART. 10 DA LEI ESTADUAL Nº 7.672/82.
Comprovado cabalmente, pelo conjunto probatório, que a autora viveu em união estável com o segurado falecido, faz jus à pensão por morte por ele deixada, devendo, como tal, ser incluída como dependente perante o IPERGS. Pensão integral a ser rateada entre a autora e a ex-esposa do segurado falecido, na proporção de 50% para cada uma delas, “ut” previsão contida no art. 10 da Lei Estadual nº 7.672/82.
Precedentes judiciais nesse diapasão. PENSÃO INTEGRAL.A pensão de que se cogita deverá ser paga pelo IPERGS, modo integral, ou seja, no montante a que faria jus o segurado, se vivo fosse, aí incluídas as vantagens pessoais. APELAÇÃO DO IPERGS DESPROVIDA. APELO DA CO-RÉ JAIRA CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. RECURSO ADESIVO DESPROVIDO. SENTENÇA MODIFICADA, OUTROSSIM, EM REEXAME NECESSÁRIO, COM ADEQUAÇÃO DO SEU DISPOSITIVO AOS TERMOS DO PEDIDO, POR APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DACONGRUÊNCIA. CORRELAÇÃO ENTRE A SENTENÇA E O PEDIDO.
(Apelação Cível nº 70010796308, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Miguel Ângelo, julgado em 31/05/2006)”
“APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PREVIDENCIÁRIO. HABILITAÇÃO DE COMPANHEIRA DE SEGURADO COMPROVADA A UNIÃO ESTÁVEL. DIREITO À PENSÃO POR MORTE. ART. 475, §3º, DO CPC. 1. Ausência de reexame necessário no caso dos autos, em face do disposto no art. 475, §3º, do CPC. 2. Satisfatoriamente comprovada a convivência entre a autora e o ex-segurado, como se casados fossem, deve a mesma ser habilitada como pensionista junto ao Instituto de Previdência. 3. De se confirmar a sentença que julgou procedente a ação de habilitação de pensão para condenar o Instituto de Previdência a habilitar a autora como pensionista e pagar-lhe o benefício integral, tendo como base os valores a que faria jus o ex-segurado, se vivo fosse, incluídas as vantagens pessoais. Condenação do IPERGS ao pagamento das diferenças vencidas desde a data do óbito, corrigidas monetariamente pelo IGPM desde cada vencimento e incidente juros legais, in casu, desde o ajuizamento, no percentual de 0,5% ao mês para as obrigações vencidas até a entrada em vigor do novo CC e 1º ao mês para as posteriores. Pensionamento que deve ser rateado entre a autora e a esposa do falecido, nos termos da lei (50% para cada uma). 4. Honorários advocatícios reduzidos, considerando a mudança de orientação da Câmara, que majorou o percentual para 10% sobre as parcelas vencidas até a implantação em folha de pagamento, diante da não mais fixação de honorários advocatícios em execução de sentença não embargadas ajuizadas contra a Fazenda Pública. Reexame não conhecido; Apelo provido em parte. (Apelação e Reexame Necessário Nº 70012171740, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Carlos Roberto Lofego Canibal, Julgado em 24/08/2005) (grifei)
“PREVIDENCIARIO. IPERGS. CONCUBINATO. CONVIVENCIA MORE UXORIO E DEPENDENCIA TOTAL DA MULHER AO COMPANHEIRO. LEGITIMA A INCLUSAO COMO DEPENDENTE. 1.A CONVIVENCIA MORE UXORIO ENTRE HOMEM E MULHER E TOTAL DEPENDENCIA ECONOMICA DELA AO COMPANHEIRO, COM O NASCIMENTO DE FILHO, GERA UMA ENTIDADE ESTAVEL, TUTELADA PELA CONSTITUICAO FEDERAL (ART-226, PAR-3 E PAR-4), QUE POE AO ABRIGO DO DIREITO PROTETIVO DA FAMILIA, COMO A GARANTIA DOS DIREITOS PREVIDENCIARIOS (CF, ART-227, PAR-3, INC-II). 2. A PENSAO DEIXADA PELO SEGURADO DEVE SER HAVIDA COMO UMA PENSAO UNICA, MAS, DIVIDIDA, NOS TERMOS DA LEI PREVIDENCIARIA ESTADUAL, ENTRE OS DEPENDENTES, NA FORMA DETERMINADA PELA LEI LOCAL. AGRAVO RETIDO E APELACAO IMPROVIDOS. SENTENCA CONFIRMADA, EM REEXAME, COM EXPLICITACAO. (Apelação Cível Nº 596252247, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Celeste Vicente Rovani, Julgado em 10/12/1997)
Diante do exposto, tenho que se mostra correto o dispositivo sentencial quando reconheceu a união estável havida entre a autora e J. C., e também quando determinou o rateio da pensão por morte entre autora e os demais dependentes do falecido.
ISTO POSTO, nego provimento ao recurso.
DES. ANDRÉ LUIZ PLANELLA VILLARINHO (REVISOR) – De acordo com o(a) Relator(a).
DR. ROBERTO CARVALHO FRAGA – De acordo com o(a) Relator(a).
DES. SÉRGIO FERNANDO DE VASCONCELLOS CHAVES – Presidente – Apelação Cível nº 70038603437, Comarca de Canela: “NEGARAM PROVIMENTO AOS RECURSOS. UNÂNIME.”
Julgador(a) de 1º Grau: FRANKLIN DE OLIVEIRA NETTO

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Estatuto da Criança e do Adolescente completa 22 anos nesta sexta-feira

Em 2007, foi sancionado o projeto de lei que determina a inclusão do ECA nos currículos escolares do ensino fundamental

O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) completa nesta sexta-feira 22 anos. A lei prevê uma série de direitos e deveres de crianças e adolescentes, pais, conselheiros tutelares, juízes, médicos, entre outros. Estabelece, por exemplo, o direito à saúde, à educação, à convivência familiar, além de questões relacionadas às políticas de atendimento, às medidas de proteção e socioeducativas.

Bárbara Antônia Arcoverde, 9 anos, aprendeu sobre o ECA em uma cartilha do Menino Maluquinho, que trata de direitos humanos para o público infantojuvenil. “Eu achei [a cartilha] lá em casa e resolvi ler. O ECA inclui as leis que protegem as crianças e os adolescentes. Eu sei que [os adultos] não podem bater, a gente não pode trabalhar e tem de estudar”.

À pergunta sobre o que deveria ocorrer com quem maltrata as crianças e os adolescentes no país, a menina respondeu que deve haver punição severa. “Deviam prender quem faz isso. Os adultos deviam ter melhor coração. Há muito caso ruim que aparece na TV”. De acordo com Bárbara, a escola também estimula o debate sobre o estatuto com textos em sala de aula.

Em 2007, foi sancionado o projeto de lei que determina a inclusão do ECA nos currículos escolares do ensino fundamental. Pelo projeto, não é necessário criar uma disciplina, mas os professores precisam desenvolver os conteúdos do estatuto em sala de aula. No entanto, essa lei não é respeitada por todas as escolas.

De acordo com Gabriel Geovani de Melo Silva, 14 anos, o ECA não é muito discutido em sala de aula, pois a escola na qual estuda não dá muita atenção à lei. “Eu não conheço muito o estatuto. O que sei, aprendi sozinho. Sei que dá o direito de viver, de ter alimentação adequada, ter os pais para cuidar e também impede o trabalho infantil”.

Para a educadora Teresa Santana, é importante que as crianças e os adolescentes saibam seus direitos e suas responsabilidades, uma vez que a sociedade ainda está muito desinformada e as crianças são vítimas de violência cotidianamente. “A TV ajuda a informar, mas tudo que é feito com abuso acaba atrapalhando. É preciso ter campanhas veiculadas, já que é o meio mais visto”.

Ela acredita que não é necessário ter uma matéria específica sobre o ECA, mas as coordenações pedagógicas poderiam tratar do assunto por meio de palestras e outras atividades. “As disciplinas também deveriam tratar disso, seja por meio de trabalhos, pesquisas, redações, pois o assunto é interdisciplinar”.

Fonte: Estado de Minas

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Avô deve alimentos somente se incapacidade dos pais ficar comprovada

A 1ª Câmara de Direito Civil do TJ alterou decisão de primeira instância e acolheu recurso de um avô paterno que recebera a incumbência de pagar alimentos mensais a uma neta. A incapacidade financeira do pai da menor não ficou provada nos autos do processo.

No apelo, o recorrente disse que, na qualidade de avô, sua obrigação de pagar alimentos é subsidiária e não principal, razão por que devem ser feitas todas as tentativas para o pai arcar com os alimentos. Requereu a extinção da obrigação imposta em 1º grau, assim como o esgotamento dos meios de cobrança da pensão contra seu filho, pai da menina, já que este tem emprego fixo e remunerado, além de ter contato com a mãe da criança.

A desembargadora Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer, que relatou o recurso, afirmou que até mesmo o telefone e o endereço do serviço do pai da menor estão expostos nos autos, além do que este compareceu à audiência de conciliação e requereu sua habilitação nos autos. Por tais motivos, “ao menos neste momento, tem-se de suspender a obrigação alimentar do avô”.

O acórdão da câmara ressalta “que o dever referente à manutenção da prole é imposto a ambos os genitores e somente nos casos de impossibilidade destes ou de sua ausência é que a obrigação alimentar deve se estender aos parentes mais próximos”. Segundo a magistrada, é imprescindível a comprovação de que os pais não têm condições de manter a prole. Como a votação foi unânime, neste momento o avô está livre da obrigação.

Fonte: Tribunal de Justiça de Santa Catarina

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Partilha de bens deve ter por base marcos de início e fim de relacionamento

A 1ª Câmara de Direito Civil do TJ anulou parcialmente sentença que, ao deliberar sobre dissolução de união estável, estabeleceu a partilha de bens entre um casal sem delimitar de forma precisa os marcos de início e fim do relacionamento.

Segundo os desembargadores, a decisão não levou em consideração que parcela dos bens partilhados foi adquirida em momento anterior ao período da união estável, e apenas por uma das partes.

“Além dos filhos do ex-casal, há outros de relações precedentes, que também têm direito a parcela dos bens”, ressaltou a desembargadora substituta Cinthia Beatriz da Silva Bittencourt Schaefer, relatora da matéria. Por essas razões, a câmara, por unanimidade, decidiu anular a partilha feita no 1º grau.

Fonte: Tribunal de Justiça de Santa Catarina

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Pênis pequeno não é motivo para anular casamento

No dia 20 de junho de 2012, o portal Âmbito Jurídico veiculou a seguinte notícia, que transcrevemos na íntegra:

“Mulher pede indenização na justiça por ter casado com homem de pênis pequeno

KDB, 26 anos, advogada e residente no município de Porto Grande no Amapá decidiu processar seu ex-marido por uma questão até então inusitada na jurisprudência nacional. Ela processa ACD, comerciante de 53 anos, por insignificância peniana.

Embora seja inédito no Brasil os processos por insignificância peniana são bastante frequentes nos Estados Unidos e Canadá. Esta moléstia é caracterizada por pênis que em estado de ereção não atingem oito centímetros. A literatura médica afirma que esta reduzida envergadura inibe drasticamente a libido feminina interferindo de forma impactante na construção do desejo sexual.

O casal viveu por dois anos uma relação de namoro e noivado e durante este tempo não desenvolveu relacionamento sexual de nenhuma espécie em função da convicção religiosa de ACD. KDB hoje o acusa de ter usado a motivação religiosa para esconder seu problema crônico. Em depoimento a imprensa a denunciante disse que “se eu tivesse visto antes o tamanho do ‘problema’ eu jamais teria me casado com um impotente”.

A legislação brasileira considera erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge quando existe a “ignorância, anterior ao casamento, de defeito físico irremediável, ou de moléstia grave”. E justamente partindo desta premissa que a advogada pleiteia agora a anulação do casamento e uma indenização de R$ 200 mil pelos dois anos de namoro e 11 meses de casamento.

ACD que agora é conhecido na região como Toninho Anaconda, afirma que a repercussão do caso gerou graves prejuízos para sua honra e também quer reparação na justiça por ter tido sua intimidade revelada publicamente. O fato é que se o gato não come o bife. Ou o gato não é gato. Ou o bife não é bife” (Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=visualiza_noticia&id_caderno=20&id_noticia=85370. Acesso em 22 de junho de 2012).

Nada obstante a notícia não nos fornecer dados conclusivos, ficando a questão a depender da análise do caso concreto pela Justiça, o fato é que o caso ganhou as redes sociais, e, pelo ineditismo afirmado, pensamos seja interessante um debate sobre o tema.

O Código Civil, ao tratar da invalidade do casamento (artigos 1.548 a 1.584) dispõe em seu art. 1.550, inciso III:

Artigo 1.550. É anulável o casamento:

(…)

III – por vício de vontade, nos termos dos arts. 1.556 a 1.558.

O artigo 1.556 dispõe que “o casamento pode ser anulado por vício da vontade, se houve por parte de um dos nubentes, ao consentir, erro essencial quanto à pessoa do outro. Adiante, o art. 1.557, III, diz:

Artigo 1.557. Considera-se erro essencial sobre a pessoa do outro cônjuge:

“(…) III – a ignorância, anterior ao casamento, de defeito físico irremediável, ou de moléstia grave e transmissível, pelo contágio ou herança, capaz de pôr em risco a saúde do outro cônjuge ou de sua descendência.”

Pois bem, inicialmente cabe-nos investigar se o episódio narrado configura caso de anulação de casamento, pois há que se determinar se o tamanho reduzido do pênis, por si só, é suficiente a autorizar a adoção da medida anulatória pretendida pela mulher.

Quanto ao pedido de anulação do casamento, o inciso III, do artigo 1.557, fala em “defeito físico irremediável”. Sendo assim, o primeiro aspecto a ser considerado é saber se um pênis cujo tamanho não se encaixa na média da população masculina pode ser considerado um defeito físico irremediável. O segundo aspecto diz respeito a descobrir se o tamanho do pênis, caso isso seja considerado um defeito, é irremediável.

Sem pretender aprofundar o tema, pesquisando a Classificação Internacional de Doenças (CID), utilizando o vocábulo “micropênis” — que é, aparentemente, a “moléstia” da qual padece o ex-marido da autora da ação, o respectivo catálogo não fornece resultados para o item pesquisado. Ao que parece, de fato não se trata de uma doença, isto é, de uma patologia, mas sim de uma condição do pênis humano. Essa definição pode ser encontrada em diversos sites da internet que tratam do assunto. Por todos, confira-se: http://www.ipadiponeipod.com/a-condicao-micropenis-NzY4NDg.html.

Sem embargo, o médico americano Brian Richards, em sua obra intitulada O Pênis (São Paulo: Editora Produtos Paradise Ltda., 1980, p. 93-103), enumera as doenças que podem acometer o pênis humano, dividindo-as em doenças gerais e doenças específicas. As primeiras relacionam-se aos hábitos de vida do indivíduo, isto é, podem derivar de obesidade, alcoolismo, dependência de outras drogas, diabetes etc; as demais têm origem no próprio órgão sexual. Ao todo, o referido autor descreve, minuciosamente, cada uma das 25 doenças que arrola em seu livro, sendo que o micropênis sequer é citado dentre as patologias.

Assim, num primeiro momento, parece-nos que a questão não envolve defeito físico, pois a literatura médica trata essa condição como mero desvio de padrão, tendo em vista que o tamanho normal do pênis humano varia de 5 a 10 cm quando flácido, e de 12,5 a 17,5 cm quando ereto, sendo que um micropênis, quando flácido, mede menos de 4 cm, e, quando ereto, não passa de 7,5 cm (Disponível em: http://www.abcdasaude.com.br/artigo.php?403. Acesso em 23/06/2012).

Ademais, a pediatra Gabriela Zanola esclarece:

“Micropênis


Nesta condição, o pênis é bem formado, mas o comprimento é inferior a uma faixa de medidas das dimensões penianas consideradas o normal para um recém-nascido. Simplificando, um recém-nascido a termo deve ter um pênis com comprimento de no mínimo 1,9cm. As dimensões inferiores devem ser alvo de uma investigação do perfil hormonal, especialmente da secreção de testosterona. A palpação dos testículos é outro aspecto importante do exame da genitália, devido a possibilidade de haver um distúrbio do desenvolvimento sexual. A causa mais comum do micropênis é o hipogonadismo hipogonadotrófico (hipotalâmica/hipofisária) e pode estar no contexto de síndromes hereditárias. O micropênis decorrente da falência testicular geralmente é acompanhado por testículos pequenos e na maioria, criptorquídicos. Alguns pacientes que apresentam micropênis de causa não identificada, com dosagens hormonais normais, apresentarão virilização espontânea e crescimento peniano adequado na puberdade. O tratamento do micropênis é a reposição hormonal.

Não deve ser confundido com micropênis aquelas condições encontradas em crianças obesas, onde o pênis fica oculto na gordura supra-púbica!” (Disponível em:http://www.brasilclinicas.com.br/artigos/ler.aspx?artigoID=166. Acesso em 23/06/2012).

Em síntese, um pênis pequeno não é considerado doença, apresentando-se como mera diferença de tamanho, se comparado com a média da população masculina.

Em relação ao requisito relacionado a ser um defeito irremediável, a questão também aponta para a impossibilidade de se acolher tal argumento, tendo em vista a Portaria 67/06, editada pelo Ministério da Saúde (que aprovou o Protocolo clínico e diretrizes terapêuticas – deficiência do hormônio do crescimento. Nas informações constantes desse documento, pode ser encontrada a seguinte informação:

“3.1 Diagnóstico clínico

Os principais achados clínicos em crianças com deficiência de GH são baixa estatura e redução na velocidade de crescimento. A investigação para deficiência de GH está indicada nas seguintes situações: “Sinais e sintomas de deficiência de GH no período neonatal (hipoglicemia, icterícia prolongada, micropênis, defeitos de linha média)”.

Além disso, podem ser encontrados inúmeros sites da internet esclarecendo sobre os possíveis tratamentos utilizando hormônios, cirurgias e fisioterapia para o micropênis, dentre eles a faloplastia, considerada simples e pouco agressiva.

Então, segundo a literatura médica, essa condição do pênis é passível de tratamento.

Sendo assim, aparentemente essa condição do pênis humano (micropênis), por não configurar um defeito físico, tampouco irremediável, afasta a pretensão da ex-esposa de anular o casamento, pois, conforme o que foi apurado acima, os requisitos do inciso III, do art. 1.557, do CC/2002, não estariam preenchidos. Não seria, então, a nosso ver, caso de anulação de casamento, mas de mero divórcio.

A notícia dá a entender que dois foram os fatos que motivaram o pedido de anulação de casamento, cumulado com a condenação em verba indenitária, a saber: (i) o desconhecimento da “doença” do ex-marido (motiva o pedido de anulação do casamento); (ii) a ex-esposa ter se sentido enganada pelo ex-marido, que escondeu dela o “problema” durante o período de namoro/noivado, bem como a frustração sexual após o casamento (motivam o pedido de compensação por dano moral).

Pois bem, quanto ao primeiro motivo, já vimos que, ao menos aparentemente (pois não conhecemos os detalhes do caso), a questão não se encaixa na hipótese prevista pelo inciso III, do artigo 1.557, do CC/2002. Por sua vez, o segundo motivo merece detida análise.

Discutindo a questão com a advogada e professora de Direito Civil Jesica Lourenço (que entende ser caso de anulação do casamento), via mensagens em uma rede social, foram por ela tecidas as seguintes considerações:

“A análise desse caso pede uma importante separação dentro do Direito Civil, das situações subjetivas puramente existenciais (que parece ser o caso) das situações efetivamente patrimoniais. Quando ingressamos na análise de situações existenciais a solução é sempre complexa e tendente a não chegar a um equilíbrio entre os dois lados, até mesmo porque o Código Civil de 2002, que já nasceu velho, não está preparado para solucionar essas situações sem o viés patrimonialista. Então, é claro que somente os contornos do caso concreto podem afirmar isso, mas pela legislação há a anulação do casamento, mas já essa indenização parece deveras abusiva, até mesmo porque se houve impacto à esfera psíquica, o impacto foi na dos dois. E tem mais: aquela grande discussão que existe hoje nas relações afetivas, se estamos nos relacionando com o sexo, com o gênero ou com a pessoa. Há uma total inversão de valores, a exposição que o marido sofreu me parece muito mais prejudicial do que o problema que ela alega. Além disso, agora não mais como civilista, mas como pessoa… Se houvesse sentimento de amor aí, ela jamais submeteria esse rapaz a isso, há coisas mais sublimes…”

É importante atentarmo-nos para a seguinte passagem, apropriadamente abordada pela eminente civilista: “aquela grande discussão que existe hoje nas relações afetivas, se estamos nos relacionando com o sexo, com o gênero ou com a pessoa…”

Vive-se a era do chamado Direito Civil Constitucional — escola que propõe o estudo das instituições do direito comum à luz da Constituição Federal, que é a norma de onde as demais retiram seu fundamento de validade. Referindo-se à doutrina atual, Flávio Tartuce e José Fernando Simão destacam o conceito de casamento, segundo a lição de Maria Helena Diniz, que assim o define: “O casamento é o vínculo jurídico entre o homem e a mulher que visa o auxílio mútuo material e espiritual, de modo que haja uma integração fisiopsíquica e a constituição de uma família” (DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. Direito de Família, 20ª ed. São Paulo: RT, 2005, p. 39,apud TARTUCE, Flávio; SIMÃO, José Fernando. Direito Civil 5. Direito de Família, 7ª ed. São Paulo: Método, 2012, pp. 35-36).

Pelo conceito da eminente civilista, percebe-se que, modernamente, o casamento é um complexo de relações que envolve não só a sexualidade dos cônjuges, mas também a consecução de objetivos de caráter patrimonial, espiritual, afetivo… Em outras palavras, não se pode olhar o casamento tão somente sob o ponto de vista sexual.

Sendo assim, surgem algumas indagações:

1. Será que, à luz das normas constitucionais, o pedido de anulação, por parte da ex-esposa, não viola o princípio da dignidade humana?

Ora, se o casamento deve ser encarado como o conceituado por Maria Helena Diniz, levar em conta somente o aspecto sexual, ignorando os aspectos espirituais e afetivos, por exemplo, a nosso ver a ex-esposa está, verdadeiramente, se lixando para os sentimentos do ex-marido que, aliás, não tem culpa alguma de ter nascido com um pênis cujo tamanho diverge do padrão. Some-se a isso o tabu envolvendo a virilidade masculina, cuja exposição negativa é capaz de provocar danos indeléveis na personalidade dos homens, verdadeiramente inutilizando-os perante a sociedade. O homem vira motivo de gozação, indubitavelmente.

Imaginemos, agora, outra situação: caso fosse o homem descobrindo, por exemplo, que a mulher não pode ter filhos, será que o problema dela causaria o mesmo efeito perante a sociedade? Pensamos que não, absolutamente! Aos olhos da sociedade, e consoante a prática cristã, uma mulher que não pode ter filhos é verdadeiramente digna de dó; penaliza as pessoas; merece, sim, ser acolhida no seio da sociedade. Aos olhos da sociedade, uma mulher que não pode ter filhos, certamente não é tão “engraçado”. Já o homem, não; ele tem que ser viril a todo custo! E se apelidassem a mulher de “árvore seca”, seria engraçado?

2. Como fica a questão do ponto de vista religioso? O sexo baseia-se somente no coito? A relação baseia-se somente no sexo?

Pois bem, ambos optaram por fazer sexo somente após o casamento; estavam de pleno acordo quanto a estes fundamentos filosóficos; decidiram pela união sem ter a relação sexual. Como relatado, os indivíduos compartilhavam da mesma premissa filosófico-religiosa, o que já demonstra uma relação aprofundada, ao menos se a considerarmos objetivamente, já que a mulher concordou com o consorte em ter relações sexuais somente após o casamento.

3. Independentemente de tudo isso, mesmo que a mulher achasse inadmissível o fato do marido ter um pênis pequeno, a anulação do casamento é a medida adequada?

Sobre esse ponto, por tudo que abordamos acima quando tratamos da questão relacionada ao micropenianismo ser ou não uma doença ou um defeito físico irremediável, pensamos que não. A medida adequada seria o divórcio, pura e simplesmente. Podemos até concordar que a incompatibilidade sexual é capaz de gerar a insuportabilidade da convivência conjugal, mas para isso existe o divórcio. A anulação é instituto destinado aos casos eleitos pelo legislador como extremamente graves, capazes de gerar uma presunção absoluta (iure et de iure) de insuportabilidade da vida em comum.

4. Dar publicidade ao fato, a ponto de o ex-marido ser apelidado de Toninho Anaconda, sendo ele conhecido em toda a cidade, solucionaria o problema?

Certamente não. Esse fato, a nosso ver, tem requintes de pura vingança. A princípio, parece-nos que a prioridade da ex-esposa era de ordem sexual, pois, se na relação do casal houvesse a convergência de todos aqueles aspectos descritos por Maria Helena Diniz em seu conceito de casamento, certamente a ex-esposa buscaria outros meios para contornar o problema, uma vez que, como dissemos, a condição de seu ex-marido não é irremediável. Digno de nota, ainda, considerar que, se o sexo é uma obrigação do casamento, logo há o risco de que não seja assim tão bom para um ou ambos os nubentes. Não significa, no entanto, que todos devam fazer sexo antes do casamento; isso vai de cada um. No entanto, já tivemos a oportunidade de ouvir de um padre, publicamente, durante a celebração do casamento de uma amiga, que isso não é algo recomendável (acreditem!). Destarte, casar sem antes ter feito sexo é, sem dúvida, um risco para quem assume essa postura.

Passando à abordagem do suposto dano moral alegado pela ex-esposa, consta da notícia que ela teria se sentido enganada pelo ex-marido, que escondeu dela o “problema” durante o período de namoro/noivado, bem como a frustração sexual após o casamento. A nosso juízo, pairam dúvidas sobre a configuração do alegado dano moral. É que deve-se investigar a conduta do ex-marido, no sentido de esconder dela a sua condição.

Como dissemos, a relação entre os nubentes deveria ser pautada não só sob o ponto de vista sexual. Havendo no casamento deveres recíprocos de índole espiritual e afetiva, ao descobrir o problema do ex-marido, a ex-esposa deveria adotar uma conduta de compaixão, a qual seria mais condizente com todo o amor que, ao menos em tese, permeou a relação, a ponto de ela concordar em passar o período de dois anos de namoro/noivado sem que o casal tivesse relações sexuais. Em outras palavras, ela anuiu à manifestação do futuro marido, no sentido de se abster do sexo, correndo, assim, o risco de ter uma vida sexual insatisfatória, ainda que seu futuro marido tivesse um pênis normal. E mais: suponha-se que, ao contrário, o pênis do futuro marido fosse demasiadamente avantajado, e provocasse dores insuportáveis à mulher no momento da cópula. Isso é absolutamente subjetivo! Se levarmos isso em consideração, não há que se falar em dano moral algum sofrido pela ex-esposa, pois ter um micropênis é um fato (um acontecimento natural), e não um ato do homem, sendo que o dever de indenizar decorre de um ato ilícito (artigo 186 do CC/2002), isto é, de uma manifestação decorrente da vontade humana, que venha a causar prejuízo material ou moral a outrem.

De sua sorte, analisando a situação do ex-marido, em nossa opinião não há dúvidas de que ele é quem, verdadeiramente, sofreu abalo moral considerável. Absolutamente, não havia necessidade de que a ex-esposa tornasse publico o fato, o qual, pelo teor da notícia, repercutiu negativamente sobre a honra do homem (honras objetiva e subjetiva), mormente por ter sido ventilado na imprensa. Ora, se todos os elementos descritos por Maria Helena Diniz estivessem presentes na relação entre o casal, certamente a última providência da ex-esposa seria dar publicidade à condição do ex-marido!

Nada obstante, na hipótese de se considerar que o ex-marido realmente causou algum dano moral à ex-esposa, deverá ser reconhecida a concorrência de causas, tendo em vista a conduta muito mais danosa praticada pela mulher. Nesse caso, aplica-se o disposto no artigo 945 do CC/2002, que diz:

Artigo 945. Se a vítima tiver concorrido culposamente para o evento danoso, a sua indenização será fixada tendo-se em conta a gravidade de sua culpa em confronto com a do autor do dano.

Por fim, o tema não se esgota aqui. Nossa intenção neste breve texto é somente convocar os estudiosos do Direito Civil ao debate, tendo em vista o noticiado ineditismo do caso, que não possui precedentes em nossas cortes.

Fonte: Conjur

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Liminar concedida em sede de ação de guarda, para o pai. Pretensão de modificação da decisão. Manutenção do status atual.

Processo: 2011.081156-2 (Acórdão)
Relator: Gilberto Gomes de Oliveira
Origem: Caçador
Orgão Julgador: Segunda Câmara de Direito Civil – TJ/SC
Data: 08/03/2012
Juiz Prolator: Gisele Ribeiro

AGRAVO DE INSTRUMENTO. LIMINAR CONCEDIDA EM SEDE DE AÇÃO DE GUARDA, PARA O PAI. PRETENSÃO DE MODIFICAÇÃO DA DECISÃO. SITUAÇÃO DA GUARDA CONSOLIDADA. PREPONDERÂNCIA DOS INTERESSES DA CRIANÇA. ART. 6º DO ECA. MANUTENÇÃO DO STATUS ATUAL. DECISÃO MANTIDA.

Consolidada a situação de guarda, por força de liminar, não é aconselhável – tirante casos extremos – que a criança seja exposta, novamente, aos percalços naturais da mudança pretendida, ainda mais quando se corre o risco de nova modificação quando do julgamento definitivo da lide. Isto porque o sentido norteador das decisões definidoras de guarda deve se lastrar na preponderância do interesse da criança sobre qualquer outro, tomando-se em consideração o seu desenvolvimento saudável.

RECURSO NÃO PROVIDO.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n. 2011.081156-2, da comarca de Caçador (1ª Vara Cível), em que é agravante A. C. V. A. Z., e agravado D. Z. J.:

A Segunda Câmara de Direito Civil decidiu, à unanimidade, conhecer do recurso e negar-lhe provimento. Custas legais.

Participaram do julgamento, realizado nesta data, os Exmos. Srs. Des. Trindade dos Santos (Presidente) e Nelson Schaefer Martins.

Florianópolis, 16 de fevereiro de 2012.

Gilberto Gomes de Oliveira

Relator

RELATÓRIO

A. C. V. A. Z. interpôs agravo de instrumento contra decisão que, em ação de guarda/modificação de guarda que lhe move D.Z.J., conferiu a guarda liminar da criança I. Z. a este último.

Diz que aforou ação de divórcio em face de D.Z.J., oportundade em que obteve a guarda da criança (fls. 64/80). Ocorre que a magistrada, de forma serôdia, revogou a decisão (fls. 82/83) sob o fundamento de que havia conferido a guarda anteriormente ao ora agravado, quando ele agitou ação de guarda da filha contra a ora agravante. Para defender seu ponto de vista, diz que a simples anterioridade do aforamento de uma ação não é pressuposto para a concessão ou revogação de decisões, razão pela qual a magistrada deveria, na ação de divórcio, apreciar o pedido de guarda com base em elementos de prova necessários à concessão da medida.

Assevera que o agravado não tem condições de cuidar da filha comum do casal, evidenciando que a agravante detém melhores requisitos para ficar com a guarda da filha até que se ultime a celeuma judicial.

Assevera que possui laços muito fortes com a criança e que a ruptura do convívio vai trazer sérios prejuízos para a criança.

Pugna pela concessão liminar do retorno da criança ao seu convívio.

Decisão de fls. 88/91 indeferindo a liminar pleiteada.

Parecer ministerial (fls. 100/101), pugnando pela manutenção da decisão.

Ascenderam os autos.

Este é o relatório.

VOTO

Trata-se de agravo de instrumento tendente a atacar decisão que, nos autos da ação de guarda/modificação de guarda que o agravado move em face da agravante, acabou por conferir este direito para o genitor da infante.

Vejo que, efetivamente, na ação de guarda o agravado obteve provimento antecipatório em 13.09.2011 (fls. 18/22) e neste mesmo dia a agravante aforou ação de divórcio (fls. 64/74). Nesta ação a magistrada deferiu a guarda para a ora agravante (fls. 79/80) e a fls. 82/83 revogou a decisão porque a guarda já havia sido deferida ao pai da criança.

Pois bem! Segundo diz o Estatuto da Criança e do Adolescente:

Art. 33. A guarda obriga à prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais.

[…]

2º. Excepcionalmente, deferir-se-á a guarda, fora dos casos de tutela e adoção, para atender a situações peculiares ou suprir a falta eventual dos pais ou responsável, podendo ser deferido o direito de representação para a prática de atos determinados.

A prioridade, no que toca à guarda, é a preservação dos interesses da criança sobre todo e qualquer outro.

Neste sentido, a doutrina:

A razão primordial que deve presidir a atribuição da guarda em tais casos é o interesse do menor, que constitui o grande bem a conduzir o juiz, no sentido de verificar a melhor vantagem para o menor, quanto ao seu modo de vida, seu desenvolvimento, seu futuro, sua felicidade e seu equilíbrio. (Guarda de Filhos, 1ª ed., São Paulo: LTr, 1998, p. 56).

E a jurisprudência desta Corte de Justiça:

GUARDA. MENOR. PREPONDERÂNCIA DOS INTERESSES DA CRIANÇA SOBRE QUAISQUER OUTROS. DESPROVIMENTO.

Tratando-se de guarda de filho menor, deve atender-se aos interesses da criança e às condições e comportamento dos pretendentes à guarda.

Não há dúvida que a proteção aos interesses do menor sobrepõe qualquer outro bem ou interesse juridicamente tutelado (ACV n. 34.876, rel. Des. Wilson Guarany).

No caso em estudo, entendo que o conflito que permeia a vida dos pais, como motivo para a mudança da guarda, perde todo o colorido em face da situação moderna vivida pela criança.

Inicie-se dizendo que a magistrada, quando deferiu a guarda provisória da criança para o seu genitor (na ação de guarda/modificação de guarda), analisou percucientemente os elementos necessários para que a infante com ele permanecesse, pelo menos até de que se ultimasse a ação referida. Isto me leva à afirmação inexorável de que o deferimento da guarda para a ora agravante, na ação de divórcio, foi um mero equívoco da magistrada, que, logo que o percebeu, tratou de esclarecer que a situação da criança já estava resolvida por meio da decisão dada na ação de guarda/modificação de guarda.

Não encontro nos autos nada que sinalize prejuízo para a criança com a permanência dela com o pai, do contrário, pelo menos em sede de cognição sumária – justo o caso – ele detém perfeitas condições de prover ao seu sustento físico e emocional. Para tanto, é bastante que se vejam os documentos colacionados aos autos, onde encontro elementos probatórios que trazem à lume um relacionamento cuidadoso e responsável (fls. 37/40).

Não é dizer que a genitora não tenha condições de prover a filha de cuidados. No entanto, a se considerar que a guarda já está com o pai, é pertinente que se verifique a situação moderna vivida pela criança, no sentido de não ser recomendável, agora, nova modificação da guarda, em sede de agravo de instrumento, que não é palco para amplas discussões sobre quem tem melhores condições de ficar com a infante.

A guarda liminar foi dada ao pai na ação de guarda (fls. 18/22) porque há sérios indícios que a criança já estava na guarda de fato dele, tanto que é ele quem a leva para o colégio e frequenta as reuniões de pais. (fl. 37/40).

Isto porque depois do divórcio, a mãe da criança voltou pra casa materna, e, como viajava muito a trabalho (ficava de dois a três dias por semana fora da cidade conforme declarou a fl. 52), a criança acabava por ficar com a avó ou com o pai. Com isto, na prática, era o pai quem dispensava os cuidados necessários à criança, razão pela qual o magistrado entendeu por bem chancelar esta situação de fato.

É fato que a mãe agravante disse que não mais precisa se deslocar a trabalho (fl. 59). No entanto, uma nova modificação de guarda, agora, não mais se apresenta viável em sede de agravo de instrumento, ainda mais considerando que tudo pode voltar a mudar quando do julgamento da ação de guarda.

Dito isto, entendo que o melhor caminho, no momento, é a manutenção dostatus atual, ou seja, que a criança permaneça com seu pai. Digo isto porque não seria saudável desfazer, novamente, uma situação que está consolidada, modificando pela segunda vez a guarda para colocá-la sob os cuidados da mãe, ainda mais considerando a possibilidade de nova mudança, no julgamento definitivo da causa. A insegurança da criança somente aumentaria e os ânimos entre as partes se acirrariam ainda mais, em prejuízo de quem já foi suficientemente prejudicado.

Releva anotar que a agravante não trouxe nenhuma prova de algum fato que desabone a boa conduta de pai do agravado.

Entendo que, então, a guarda deva permanecer com o pai da criança, já que a situação está consolidada, não sendo aconselhável que seja ela exposta, novamente, aos percalços naturais da mudança pretendida.

De outro lado, entendo que devam os pais fomentar um convívio saudável entre si, reservando seus acertamentos para uma esfera que não atinja a pessoa mais frágil nesta relação, tudo a fim de preservar o bom desenvolvimento físico, mental e emocional daquela pessoa cuja guarda disputam.

Este é o voto.

Gabinete Des. Gilberto Gomes de Oliveira

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Ação quer garantir “cura” de homossexuais

MPF PROPÕE ANULAÇÃO DE RESOLUÇÃO QUE PROÍBE CURA GAY

“Todos que desejam podem deixar o estado da homossexualidade. Basta querer. Deus nos fez macho e fêmea, e não temos escolha quanto a isso” – Pastor Joide Miranda – Ex-travesti e defensor da cura de homossexuais.

“A resolução não impede que psicólogos atendam a pacientes homossexuais. Proíbe que ofereçam a cura para homossexuais, porque não é doença” – Andréa Nascimento – Presidente do Conselho Regional de Psicologia (CRP).

A homossexualidade deixou de ser considerada doença pela Organização Mundial de Saúde desde 1990. No Brasil, uma resolução do Conselho Federal de Psicologia (CFP), desde 1999, proíbe psicólogos de tratarem-na como transtorno ou doença. Mas agora, 13 anos depois da resolução, considerada um avanço pelo movimento LGBT, o Ministério Público Federal (MPF) no Rio de Janeiro quer modificar a resolução.

A iniciativa partiu de três procuradores do MPF, que deram entrada numa ação civil pública para anular a parte da resolução do CFP que proíbe que profissionais ofereçam “cura” da homossexualidade. Os procuradores alegam que a resolução do CFP “impede que psicólogos atendam clinicamente homossexuais que desejam mudar a orientação sexual.”.

A ação civil pública é considerada pelo Conselho Regional de Psicologia uma iniciativa ultrapassada. “Essa iniciativa nos causou estranheza já que essa questão já foi discutida, e essa polêmica está fora de questão. Essa ação vai na contramão da Constituição Federal, que garante a liberdade de expressão a todos. O MPF não está atuando de forma a contribuir para a superação de tabus e preconceitos.”, destaca Andréa dos Santos Nascimento, presidente do Conselho Regional de Psicologia.

SEM IMPEDIMENTO

De acordo com Andréa, a resolução não impede que psicólogos atendem pacientes homossexuais, mas proíbe o profissional de oferecer “cura” da homossexualidade. “Podemos oferecer atendimento clínico ao paciente homossexual como fazemos com pessoas de qualquer orientação sexual, que buscam atendimento para tratar problemas diversos, relacionados ou não à orientação sexual.”, esclarece.

Rebeca Valadão Bussinger, representante do Conselho Regional de Psicologia no Fórum Estadual LGBT, também considera a ação proposta pelo MPF um retrocesso. “O Fórum LGBT tem se esforçado para que a resolução do Conselho Federal de Psicologia não seja alterada. Somos contra essa movimentação, iniciativa de grupos fundamentalistas evangélicos”, opina.

ENTENDA

Homossexualidade

-> Doença mental: Durante muitos anos, a homossexualidade foi encarada como problema de saúde pública, classificada como doença mental.

-> Mudança: Só em 1990 a Organização Mundial de Saúde excluiu o homossexualismo da lista de classificação internacional de doenças.

-> Proibição: No Brasil, em 1999, uma resolução do Conselho Federal de Psicologia (CFP) proibiu psicólogos de tratarem a homossexualidade como transtorno ou doença.

-> Ação e Lei: Hoje, uma ação civil pública, de iniciativa do MPF do Rio de Janeiro, e um projeto de lei, de autoria do deputado João Campos (PSDB-GO), tentam anular parte da resolução do CFP que proíbe profissionais de prometerem a cura da homossexualidade.

RESOLUÇÃO NA MIRA DE PROJETO DE LEI NA CÂMARA

Tramita na Câmara dos Deputados outra tentativa de mudar a resolução do Conselho Federal de Psicologia (CFP) que proíbe psicólogos de emitirem opiniões públicas ou tratarem a homossexualidade como um transtorno.

Esse projeto quer vetar a validade de dois dispositivos da Resolução 1/99 do CFP que impedem psicólogos de usarem a mídia para reforçar preconceitos ou propor tratamento para homossexuais.

Apelidado de “cura gay” o projeto é de autoria do deputado João Campos (PSDB-GO), líder da Frente Parlamentar Evangélica. Segundo o parlamentar, o Conselho Federal de Psicologia não tem autonomia para restringir o trabalho dos profissionais nem limitar o direito dos homossexuais que desejam receber orientação profissional.

PASTOR QUE JÁ FOI TRAVESTI AFIRMA: É POSSÍVEL DEIXAR DE SER GAY

Para o pastor Joide Miranda, 47 anos, que é ex-travesti, a cura de homossexuais é possível. “Todos que desejam podem deixar o estado da homossexualidade. Basta querer. Deus nos fez macho e fêmea, e nós não temos escolha quando a isso”, conta o pastor.

Aos 12 anos, Joide assumiu sua homossexualidade e logo depois tornou-se travesti. Aos 18 anos, foi morar na Europa. Só aos 26 anos voltou ao Brasil e converteu-se com a influência da mãe, que era evangélica na época.

Atualmente, define-se heterossexual. “O início foi muito difícil. Foram quase quatro anos de trabalho espiritual e religioso para eu conseguir mudar definitivamente”, explica.

Hoje, Joide mora no Mato Grosso, com a esposa, Edna, com quem é casado há 14 anos, e o filho, Pedro, de 1 ano e 10 meses. Além de rodar o país contando sua história, ele fundou a ABexLGBTT (Associação Brasileira de Ex-LGBTTs), entidade que apoia pessoas que “desejam deixar voluntariamente o estado da homossexualidade.”.

Reportagem extraída do Jornal A Gazeta (Vitória-ES), de 07 de julho de 2012.

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