Superior Tribunal de Justiça
Superior Tribunal de Justiça
SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA Nº 493 – EX (2011/0034271-1)
RELATORA : MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA
REQUERENTE : H H A A
ADVOGADO : FABIANA RICARDO MOLINA E OUTRO(S)
REQUERIDO : N P H
ADVOGADO : ALDANO JOSÉ VIEIRA NETO
EMENTA
SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA. DIVÓRCIO DECRETADO PELA JUSTIÇA ALEMÃ. EXISTÊNCIA DE AÇÃO DE SEPARAÇÃO NO BRASIL. COMPETÊNCIA CONCORRENTE. INOCORRÊNCIA DE LITISPENDÊNCIA. A competência internacional concorrente por fato praticado no Brasil, conforme previsão do art. 88, III, do CPC, não induz a litispendência, podendo a Justiça estrangeira julgar os casos a ela submetidos. Podendo o divórcio ser decretado sem que feita a partilha de bens, não se afigura correto imaginar que a existência pura e simples de imóvel do casal em território brasileiro impediria a competência da Justiça estrangeira para apreciar a dissolução do casamento. Inteligência da Súmula 197 desta Corte.
Além do que, a parte requerida assentiu à dissolução do casamento mesmo tendo proposta anterior ação de separação no Brasil e, neste procedimento, não contesta a homologação do divórcio, não podendo ser beneficiada, portanto, com a alegação da litispendência.
Pedido de homologação deferido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça: A Corte Especial, por unanimidade, deferiu o pedido de homologação, nos termos do voto da Senhora Ministra Relatora. Os Srs. Ministros Raul Araújo, Antonio Carlos Ferreira, Villas Boas Cueva, Sebastião Reis Júnior, Felix Fischer, Laurita Vaz, João Otávio de Noronha, Teori Albino Zavascki, Castro Meira, Arnaldo Esteves Lima, Massami Uyeda e Humberto Martins votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Gilson Dipp, Eliana Calmon, Francisco Falcão e Nancy Andrighi.
Convocados os Srs. Ministros Raul Araújo, Antonio Carlos Ferreira, Villas Bôas Cueva e Sebastião Reis Júnior para compor quórum.
Brasília, 31 de agosto de 2011(Data do Julgamento).
Ministro Ari Pargendler
Presidente
Ministra Maria Thereza de Assis Moura
Relatora
SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA Nº 493 – DE (2011/0034271-1) (f)
RELATORA : MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA
REQUERENTE : H H A A
ADVOGADO : FABIANA RICARDO MOLINA E OUTRO(S)
REQUERIDO : N P H
ADVOGADO : ALDANO JOSÉ VIEIRA NETO
RELATÓRIO
MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA (Relatora):
Cuida-se de pedido de homologação de sentença estrangeira de divórcio lavrada pela Primeira Instância da cidade de Ludwigshafen no Reno, Alemanha, cujo procedimento iniciou-se perante o Supremo Tribunal Federal, tendo por Requerente H. H. A. A., de nacionalidade alemã, e, como Requerida N. P. H., cidadã brasileira.
Com a entrada em vigor da EC n.º 45/2004, vieram os autos a esta Corte, sendo determinado o cumprimento das formalidades legais, sobretudo com relação à juntada de originais chanceladas pelo Consulado Brasileiro na Alemanha, bem como, a sua tradução por profissional habilitado no Brasil.
Em atendimento ao pedido, o Requerente fez acostar os documentos de fls. 24/35, 95/98 e, ainda, 116/125.
Com isso, determinou-se a citação da Requerida por carta rogatória, que depois de inúmeras diligências resultou na contestação de fls. 472/476, por cujo contexto se alegou a existência de litispendência do procedimento homologatório com ação de separação judicial c/c arrolamento de bens proposta no Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de São Francisco do Sul, SC (Processo n.º 061.01.001900-7), que segundo as informações trazidas pela parte, às fl. 474/475, ainda pende de definição pela Justiça brasileira, já que suspensa a apelação para aguardar o término do presente procedimento de homologação (Apelação n.º 2009.012560-8 – em curso no TJ/SC).
Aduziu-se, também, que o fato de a realização do matrimônio ter ocorrido no Brasil, isso afastaria a competência da Justiça alemã, sendo a sentença de divórcio uma violação à soberania nacional.
Em nova vista, o Requerente pugna pela rejeição da preliminar de litispendência e, no mérito, pelo deferimento do pedido inicial.
Em sua manifestação, o Ministério Público Federal opinou pelo deferimento do pedido, consoante parecer de fl. 955.
É o relatório.
SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA Nº 493 – DE (2011/0034271-1) (f)
EMENTA
SENTENÇA ESTRANGEIRA CONTESTADA. DIVÓRCIO DECRETADO PELA JUSTIÇA ALEMÃ. EXISTÊNCIA DE AÇÃO DE SEPARAÇÃO NO BRASIL. COMPETÊNCIA CONCORRENTE. INOCORRÊNCIA DE LITISPENDÊNCIA. A competência internacional concorrente por fato praticado no Brasil, conforme previsão do art. 88, III, do CPC, não induz a litispendência, podendo a Justiça estrangeira julgar os casos a ela submetidos.
Podendo o divórcio ser decretado sem que feita a partilha de bens, não se afigura correto imaginar que a existência pura e simples de imóvel do casal em território brasileiro impediria a competência da Justiça estrangeira para apreciar a dissolução do casamento. Inteligência da Súmula 197 desta Corte.
Além do que, a parte requerida assentiu à dissolução do casamento mesmo tendo proposta anterior ação de separação no Brasil e, neste procedimento, não contesta a homologação do divórcio, não podendo ser beneficiada, portanto, com a alegação da litispendência.
Pedido de homologação deferido.
VOTO
MINISTRA MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA (Relatora):
O objeto do procedimento de homologação ora analisado cinge-se à sentença de divórcio acostada às fls. 6/10, cuja tradução encontra-se às fls. 11/15, lavrada em 19/11/2002, na qual se decretou, unicamente, como sói acontecer, a dissolução do casamento do Requerente com a Requerida, este ocorrido no Brasil aos 21/1/1994.
Urge, em primeiro plano, averiguar as preliminares suscitadas pela Requerida, sobretudo em relação à litispendência entre o procedimento de divórcio e a ação de separação em curso na justiça brasileira, e ao fato de o casamento ter sido contraído em solo pátrio, o que, segundo se afirmou na contestação, afetaria a soberania nacional.
Para a Requerida, no primeiro caso, o divórcio decretado pela sentença que se busca homologar com o presente procedimento não pode ser considerado porque a existência concomitante da ação de separação em curso na 1ª Vara Cível da Comarca de São Francisco do Sul, SC (Processo n.º 061.01.001900-7), atualmente em grau de recurso, tornou a Justiça estrangeira incompetente, devendo-se prevalecer a decisão a ser tomada pela Justiça brasileira.
Nesse sentido, cumpre anotar que a ação de separação proposta no Brasil foi ajuizada em 16/4/2001, enquanto que o divórcio no Juízo alemão ocorreu no curso desse procedimento, sendo concluído em 19/11/2002, dando a entender que a Requerida, mesmo tendo deduzido o pedido de dissolução da sociedade conjugal, acorreu à Justiça estrangeira para participar do processo de divórcio, a ele conferindo integral assentimento.
Portanto, verificada a existência dos dois procedimentos, o de divórcio perante a Justiça estrangeira e o de separação perante a Justiça brasileira, concluído aquele em primeiro lugar, o caso decorre da interpretação do art. 88, III, do Código de Processo Civil, que estatui a chamada competência internacional concorrente quando “a ação originar de fato ocorrido ou de ato praticado no Brasil”, na espécie, tratando-se do casamento realizado em território nacional.
Como bem defende a doutrina especializada, “No caso de competência internacional concorrente, a decisão proferida em outro país pode ter validade no território nacional, desde que seja ela devidamente homologada pelo Superior Tribunal de Justiça (art. 105, I, i, conforme Emenda Constitucional n. 45, de 08 de dezembro de 2004). Não obstante isso, a mera propositura de demanda perante tribunal estrangeiro, a respeito de causa que poderia, por competência concorrente, ser conhecida pela jurisdição brasileira, não induz litispendência nem impede que a autoridade brasileira conheça da mesma causa e das que lhe forem conexas (art. 90 do CPC)” (Luiz Guilherme Marinoni, Sérgio Cruz Arenhart. Curso de Processo Civil, volume 2, 6ª Edição, pág. 39. São Paulo: RT, 2007).
Assim, não se afigura conveniente a aplicação do instituto da litispendência, ainda mais quando sabido que o procedimento no estrangeiro transcorreu com a oitiva da Requerida, que dele participou ativamente, sendo a decisão lá proferida transitada em julgado sem qualquer discordância de sua parte, consoante mesmo admite em sua contestação, verbis (fl. 474):
“Quanto ao divórcio propriamente dito, não se insurge a requerida, devendo ser homologada parcialmente a sentença estrangeira neste especial, resguardando os demais questionamentos a decisão do juízo da comarca de São Francisco do Sul/SC e respectivo Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina, notadamente no que diz respeito aos alimentos, guarda de filho menor, visitas e quanto à partilha dos bens amealhados pelos divorciandos.”
Aliás, o intuito de se beneficiar imerecidamente da situação, já que propôs ação no Brasil, apontando como domicílio a cidade de São Francisco do Sul, SC, e, concomitantemente, participou do procedimento de divórcio, nele dizendo ter como domicílio a cidade de Ludwigshafen no Reno, não pode ser aceito como meio de impedir o ato de internalização da sentença estrangeira.
De outro lado, tem-se a questão de o casamento ter sido realizado no Brasil, local em que se encontra a maior parte dos bens do casal.
No caso, tenho que a questão do matrimônio ter-se realizado em território brasileiro não interfere na possibilidade de a causa relativa à dissolução do casamento ser conhecida da Justiça estrangeira, conforme já dito acima.
Ademais, a questão atinente à partilha de bens também, como visto da decisão homologanda, não fez parte do seu contexto, o que retira qualquer menção acerca de possível confronto com a soberania nacional.
Na hipótese, o que é importante concluir é que o procedimento de divórcio decretado pela Justiça alemã equivaleu ao que consta da lei brasileira, devendo ser, por isso, internalizada em solo pátrio a sentença dele advinda, sem falar que a questão da partilha de bens pode ser ainda decidida mesmo com o reconhecimento da dissolução do casamento ora pretendido, uma vez que a ação no Brasil encontra-se suspensa aguardando a conclusão deste procedimento de homologação.
A propósito, aplicável o enunciado 197 desta Corte, que reza:
“O divorcio direto pode ser concedido sem que haja prévia partilha dos bens.”
No mais, verificado que o teor da sentença homologanda cingiu-se a unicamente decretar a dissolução do casamento, não merece cogitar-se de possível comprometimento das ações na Justiça brasileira buscando dispor sobre a partilha de bens, a guarda dos filhos, o direito de visitação e outras pertinentes; e que não digam respeito ao divórcio especificamente, as quais poderão seguir curso normal, porque não afetadas pelo pedido aqui formulado.
Observado o cumprimento dos requisitos legais, conforme previsão da Resolução n.º 9 desta Corte, é de se julgar cabível a pretensão formulada.
Ante o exposto, defiro a homologação da sentença de divórcio.
É o voto.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
CORTE ESPECIAL
Número Registro: 2011/0034271-1 SEC 493 / DE
Números Origem: 200500070579 82607 8799
PAUTA: 17/08/2011 JULGADO: 31/08/2011
SEGREDO DE JUSTIÇA
Relatora
Exma. Sra. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA
Presidente da Sessão
Exmo. Sr. Ministro ARI PARGENDLER
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. HAROLDO FERRAZ DA NOBREGA
Secretária
Bela. VANIA MARIA SOARES ROCHA
AUTUAÇÃO
REQUERENTE : H H A A
ADVOGADO : FABIANA RICARDO MOLINA E OUTRO(S)
REQUERIDO : N P H
ADVOGADO : ALDANO JOSÉ VIEIRA NETO
ASSUNTO: DIREITO CIVIL – Família – Casamento – Dissolução
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia CORTE ESPECIAL, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Corte Especial, por unanimidade, deferiu o pedido de homologação, nos termos do voto da Senhora Ministra Relatora.
Os Srs. Ministros Raul Araújo, Antonio Carlos Ferreira, Villas Bôas Cueva, Sebastião Reis Júnior, Felix Fischer, Laurita Vaz, João Otávio de Noronha, Teori Albino Zavascki, Castro Meira, Arnaldo Esteves Lima, Massami Uyeda e Humberto Martins votaram com a Sra. Ministra Relatora.
Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Gilson Dipp, Eliana Calmon, Francisco Falcão e Nancy Andrighi.
Convocados os Srs. Ministros Raul Araújo, Antonio Carlos Ferreira, Villas Bôas Cueva e Sebastião Reis Júnior para compor quórum.