Arquivo do dia: 21 de outubro de 2011

Doação de ascendente à descendente. Limitação a parte disponível. Nulidade da parte inoficiosa

Tribunal Julgador: TJDF

Órgão 6ª Turma Cível

Processo N.  Apelação Cível 20110110151073APC

Apelante(s)    P. L. B. L. E OUTROS

Apelado(s)    T. F. V. B. rep. por A. F. V. E OUTROS

Relator           Desembargador JAIR SOARES

Revisor          Desembargador JOSÉ DIVINO DE OLIVEIRA

Acórdão Nº    541.476

E M E N T A

DOAÇÃO DE ASCENDENTE À DESCENDENTE. LIMITAÇÃO A PARTE DISPONÍVEL. NULIDADE DA PARTE INOFICIOSA. AVALIAÇÃO DO BEM.

1 – A doação de ascendente à descendente importa adiantamento da legítima.

2 – O ascendente doador pode dispor, livremente, sobre a metade do seu patrimônio, parte considerada pela lei disponível. Assim, perfeitamente possível que um herdeiro necessário, contemplado com a porção disponível, receba mais do que outro, vez que receberá, além de sua cota parte da legítima, mais o que o ascendente lhe testar ou lhe doar em vida da parte disponível.

4 – Nula, contudo, é a doação quanto à parte que exceder a que o doador, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento.

5 – Apelação provida em parte.

A C Ó R D Ã O

Acordam os Senhores Desembargadores da 6ª Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, JAIR SOARES – Relator, JOSÉ DIVINO DE OLIVEIRA – Revisor, VERA  ANDRIGHI – Vogal, sob a Presidência do Senhor Desembargador JOSÉ DIVINO DE OLIVEIRA, em proferir a seguinte decisão: DEU-SE PARCIAL PROVIMENTO. UNÂNIME, de acordo com a ata do julgamento e notas taquigráficas.

Brasília (DF), 10 de outubro de 2011

Certificado nº: 44 36 9E C4

13/10/2011 – 13:30

Desembargador JAIR SOARES

Relator

R E L A T Ó R I O

Trata-se de apelação em inventário e partilha de bens, deixados por M. J. T. B., cuja sentença julgou procedente o pedido e partilhou os bens na forma do esboço apresentado pela Contadoria Judicial.

Argúem os apelantes, em preliminar, nulidade de sentença por falta de fundamentação e cerceamento de defesa, por não ter sido examinada a impugnação que apresentaram ao esboço da partilha.

No mérito, sustentam que o imóvel sito à SCRN 708/709, bloco “B”, lojas 36/37, apt. 101, 102 e 103, lhes foi doado pelo autor da herança. E a doação não ultrapassou a metade disponível dos bens que ele possuía e não foi arguida nulidade. Deve ser respeitada a vontade do autor da herança e retirado do monte o patrimônio doado a quatro dos seis filhos que teve.

Afirmam que a colação e a partilha dos bens devem ser feitas tendo por base o valor desses na data da abertura da sucessão, o que não foi observado.

Preparo regular (f. 602). Contrarrazões apresentadas (fls. 616/26 e 627/38).

V O T O S

O Senhor Desembargador JAIR SOARES – Relator

A Constituição Federal exige que as decisões judiciais sejam fundamentadas (CF, art. 93, IX). Com efeito, fundamentar a decisão é examinar as questões de fato e de direito suscitadas pelas partes (CPC, art. 458, II), dando o juiz as razões de seu convencimento.

O juiz, embora livre para formar a sua convicção, deve indicar na decisão as razões que lhe formaram o convencimento. A motivação, requisito essencial das decisões judiciais, porque de ordem pública, caso não se faça, leva a nulidade da decisão, pois, “o preceito da motivação”, ensina Lopes da Costa, é que põe a administração da Justiça a coberto da suspeita dos dois piores vícios que possam manchá-la: o arbítrio e a parcialidade.” (in Moacyr Amaral Santos, Comentários ao Código de Processo Civil, vol. IV, Forense, 4a edição, 1986, p. 407).

Fundamentação sucinta não é o mesmo que falta de fundamentação. Nula é a decisão que carece da devida motivação, não a com fundamentação sucinta, que contém os requisitos essenciais, a exemplo da sentença recorrida.

Nesse sentido, o seguinte precedente do c. STJ anotado por Theotônio Negrão:

“A Constituição não exige que a decisão seja extensamente fundamentada. O que se exige é que o juiz ou tribunal dê as razões de seu convencimento” (STF-2ª Turma, AI 162.089-8-DF-AgRg, rel. Min. Carlos Velloso; apud Código de Processo Civil e legislação processual em vigor, 39ª edição, atualizada até 16.1.2007, Saraiva).

E a impugnação dos apelantes ao esboço da partilha foi examinada quando proferida a sentença, embora contrariamente aos interesses desses.

Rejeito as preliminares.

A sucessão foi aberta em 1992, ano em que faleceu o pai dos apelantes. Rege-se, pois, pelo Código Civil de 1916, cujo art. 1.786, dispunha que os descendentes, que concorrerem à sucessão do ascendente comum, são obrigados a conferir as doações e os dotes, que dele em vida receberam.

Os apelantes são fruto do casamento do inventariado com L. A. M. Além dos apelantes, o autor da herança teve mais dois filhos J. M. O. B. e T. F. V. B., ora apelados, frutos de outros relacionamentos, que haviam sido excluídos da primeira partilha realizada, que, por isso, foi anulada (fls. 25 e 163).

Em 8.1.1990, o inventariado e sua esposa doaram aos filhos comuns, ora apelantes, o imóvel localizado na SCRN 708/709, bloco “B”, lojas 36/37, apt. 101, 102 e 103, conforme escrituras públicas de doação (fls. 339/350).

No momento da doação, declararam os doadores que o patrimônio doado não ultrapassava a parte que poderiam dispor em testamento, conforme dispunha o art. 1.176, do CC/1916.

Embora tenham declarado que a doação referia-se à parte disponível do patrimônio que tinham, não foram os donatários, herdeiros legítimos, expressamente dispensados de trazer à colação os bens recebidos por ocasião da partilha, consoante exigiam os art. 1.788 e 1.789, do CC/1916, reproduzidos no atual CC/2002 (arts. 2005 e 2006).

Daí porque os apelantes foram obrigados a trazer à colação os bens doados pelo inventariante, decisão confirmada no julgamento, pela Turma, do agravo de instrumento n. 2007.00.2.012295-2, cuja ementa foi a seguinte:

“DOAÇÃO DE ASCENDENTE À DESCENDENTE. ADIANTAMENTO DA LEGÍTIMA. COLAÇÃO. DISPENSA.

1 – A doação de ascendente à descendente importa adiantamento da legítima.

2 – A dispensa do herdeiro necessário de colacionar o bem recebido em doação, por ascendente, não pode ser presumida, devendo constar expressamente no testamento ou no título de liberalidade. Além disso, o bem doado deve corresponder à parte disponível do patrimônio do doador, pena de nulidade da doação (art. 549, do CC/2002 e 1.788, do CC/1916).

3 – Agravo não provido.”

(20070020122952AGI, Relator JAIR SOARES, 6ª Turma Cível, julgado em 13/02/2008, DJ 21/02/2008 p. 1510)

Segundo o voto condutor:

“(…) quando o donatário for filho do doador, a doação importa antecipação de legítima. E deverá, nessa hipótese, o herdeiro, no processo de inventário, trazer à colação o bem (ou a importância respectiva), para igualar as legítimas. Pouco importa se constou expresso que a doação não excedeu a metade disponível, questão que será examinada no processo de inventário.”

Conforme o art. 1.171, do CC/1916, a doação dos pais aos filhos importa em adiantamento de legítima. E a legítima é a parte do patrimônio a qual fazem jus os herdeiros necessários.

O art. 1722, do CC/1916, dispunha que a legítima corresponde à metade dos bens que o inventariado possuir ao falecer, acrescida das doações feitas aos descendentes.

Sobre o cálculo da legítima, Maria Helena Diniz ensina que:

“Se o testador, em vida, doou bens a descendentes, dever-se-á adicionar á metade líquida apurada a doação feita; assim, impõe-se a este, para que haja igualdade nas quotas cabíveis a cadaherdeiro necessário, o dever de conferir a liberalidade, pois, se o testador, em vida, dispôs além da porção disponível, ter-se-á a redução das disposições testamentárias até igualar a legítima”. (in Código Civil Anotado, ed. Saraiva, 1995, p. 967)

Segue-se que o doador pode dispor, livremente, sobre a metade do seu patrimônio, parte considerada pela lei disponível. Assim, perfeitamente possível que um herdeiro necessário, contemplado com a porção disponível, receba mais do que outro, vez que receberá além de sua cota parte da legítima, mais o que o testador lhe deixar da parte disponível.

Da mesma forma, possível que o herdeiro necessário, seja donatário de seu ascendente, ao qual a lei permite que doe a todos ou a alguns de seus descentes a parte disponível de seu patrimônio.

As doações dos imóveis à apenas quatro dos seis herdeiros necessários ocorreram em 8.1.1990, pouco mais de dois anos antes do falecimento do inventariante, ocorrido em 16.6.1992 (f. 11).

Na petição inicial de arrolamento, ajuizada pelos apelantes e pela viúva do inventariante, os únicos bens declarados foram dois veículos, Ford/Rural, ano 1971 e GM/Opala, ano 1981, além de pequena importância depositada em instituição bancária (fls. 2/5).

O valor dos imóveis doados comparados aos demais bens existentes quando da abertura da sucessão e o curto espaço de tempo entre as doações e o falecimento do inventariante permite concluir que as doações a quatro dos seis filhos do inventariado ultrapassou a parte disponível no momento da liberalidade.

A mera declaração dos doadores no momento da doação de que o bem doado não ultrapassa a parte disponível do patrimônio não prevalece, eis que contrária as provas dos autos. Clara está a intenção de prestigiar somente os quatro filhos havidos do casamento entre os doadores, em detrimento de dois outros filhos do doador, cônjuge varão, frutos de outros relacionamentos.

Com intuito de preservar a legítima é que se exige, na venda direta de ascendente à descendente, o consentimento expresso dos demais descendentes (art. 1.164, CC/1916). Atualmente, exige-se, além do consentimento dos descendentes, o do cônjuge (art. 496, CC/02).

Embora se refira à compra e venda e não à doação, o intuito do legislador – evitar o prejuízo da legítima – deve ser observado. Não pode ser dispensado, mesmo em caso de doação, o consentimento dos demais descendentes, pena de se permitir doações claramente inoficiosas, sob o frágil argumento de que constou na escritura de doação que o bem doado compunha a parte disponível do patrimônio do doador, em evidente prejuízo dos descendentes não contemplados.

À propósito, os seguintes precedentes:

” CIVIL. INVENTÁRIO. COLAÇÃO. PEDIDO DE EXCLUSÃO DE METADE DO ÚNICO BEM ARROLADO. DOAÇÃO. AUSÊNCIA DE ANÚÊNCIA DOS DEMAIS HERDEIROS E DISPOSIÇÃO SUPERIOR A QUE PODERIA SER DISPOSTO EM TESTAMENTO. NULIDADE.

I – Nos termos do que determina o art. 1.176 do Código Civil de 1916, em vigor à época da celebração do negócio jurídico, nula é a doação quanto à parte que exceder a de que o doador, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento.

II – Ainda que tal nulidade só incida sobre a parte que excedeu aquela que o doador, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento, tal circunstância não se mostra hábil a impedir que o imóvel seja levado à colação, por força do que dispõe o art. 1.786 do CC/1916.

III – Nos termos do art. 1.132 do CC/16, os ascendentes não podem vender aos descendentes, sem que os outros descendentes expressamente consintam com aludida liberalidade.

IV – O mero fato de o inventariado ter manifestado no título de liberalidade que a doação recaía sobre a parcela disponível do seu patrimônio, não se mostra suficiente por si só para que haja dispensa do dever de colacionar o imóvel recebido por doação por um dos herdeiros necessários.

V – O parágrafo único do art. 1.014 do Código de Processo Civil não exclui a obrigação do herdeiro à colação.

VI – Desnecessária a via de processo autônomo para apuração do excesso decorrente de doação inoficiosa, medida que pode ser levada a efeito no próprio inventário.

VII – Negou-se provimento ao recurso.”

(20090020067928AGI, Relator JOSÉ DIVINO DE OLIVEIRA, 6ª Turma Cível, julgado em 26/08/2009, DJ 02/09/2009 p. 80)

“Recurso especial. Sucessões. Inventário. Partilha em vida. Negócio formal. Doação. Adiantamento de legítima. Dever de colação.

Irrelevância da condição dos herdeiros. Dispensa. Expressa manifestação do doador.

– Todo ato de liberalidade, inclusive doação, feito a descendente e/ou herdeiro necessário nada mais é que adiantamento de legítima, impondo, portanto, o dever de trazer à colação, sendo irrelevante a condição dos demais herdeiros: se supervenientes ao ato de liberalidade, se irmãos germanos ou unilaterais. É necessária a expressa aceitação de todos os herdeiros e a consideração de quinhão de herdeira necessária, de modo que a inexistência da formalidade que o negócio jurídico exige não o caracteriza como partilha em vida.

– A dispensa do dever de colação só se opera por expressa e formal manifestação do doador, determinando que a doação ou ato de liberalidade recaia sobre a parcela disponível de seu patrimônio.

Recurso especial não conhecido.” (REsp 730.483/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 03/05/2005, DJ 20/06/2005, p. 287)

A doação feita, em vida, pelo inventariado aos apelantes importou em prejuízo da legítima, ensejando alteração da igualdade dos quinhões hereditários, vez que realizada sem que dois dos seis descendentes tenham anuído com a liberalidade.

Segundo o art. 1.176, do CC/1916,  nula é a doação quanto à parte que exceder a que o doador, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento.

Destarte, a parte da doação, considerada inoficiosa – na hipótese, o que ultrapassa 25% do valor dos imóveis relacionados no esboço da Contadoria Judicial (f. 562) – é nula de pleno direito.

Saliente-se que, tratando-se de nulidade, pode ser declarada de ofício, e tampouco se submete a prazo decadencial.

A doação dos imóveis aos apelantes deve, assim, limitar-se à parte disponível. O doador inventariado possuía 50% dos imóveis doados, podendo dispor livremente de apenas 25% do valor dos imóveis, pois os outros 25% constituem a legítima.

Segue que 25% do valor dos imóveis doados deve ser dividido em seis partes iguais. Assim como deve ser dividido em seis partes iguais 50% do valor dos veículos e do valor em depósito em instituição bancária.

Os 25% restante do valor dos imóveis deve ser dividido entre os apelantes, contemplados com a doação, observando-se a cessão dos direitos hereditários feita pelo herdeiro Antonio Jorge de Lima (f. 514).

O valor a ser considerado há de ser o da avaliação do imóvel (R$ 815.000,00), conforme retificação feita pela oficiala de justiça (f. 421/2).

Aberta a sucessão em 16.6.1992, somente determinou-se a colação dos imóveis doados em 3.10.07 (f. 248/9). E esses foram corretamente avaliados em julho de 2008 (f. 422).

 Não há como considerar o valor dos imóveis como sendo o de dezesseis anos antes da primeira avaliação, o que importaria em total desigualdade na partilha.

Pertinente a citação de Theotônio Negrão, in Código de Processo Civil e Legislação Processual em vigor, 41ª edição, Saraiva, p. 1095:

“O princípio da igualdade da partilha conduz à avaliação contemporânea de todos os bens, especialmente em face da inflação existente no pais” (RTJ 110/1.162)

Dou provimento, em parte, para que apenas 25% do valor dos imóveis doados aos apelantes seja dividido entre os seis descendentes do inventariante.

O Senhor Desembargador JOSÉ DIVINO DE OLIVEIRA – Revisor

Com o Relator

A Senhora Desembargadora VERA  ANDRIGHI – Vogal

Com o Relator.

D E C I S Ã O

DEU-SE PARCIAL PROVIMENTO. UNÂNIME.

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Austríaco é indenizado após saber que os 4 filhos não eram dele

Um austríaco de 48 anos ganhou da sua ex-mulher uma indenização de 72 mil euros depois de descobrir que nenhum dos quatro supostos filhos eram seus, mas fruto de contínuas infidelidades da mulher.

Segundo o jornal BezirksRundschau, o homem nunca quis acreditar nos rumores que corriam pelos bares de sua cidade, na região da Alta Áustria.

Após 21 anos de relação, o casal se separou no último ano. Em novembro de 2010, o austríaco fez o primeiro teste de paternidade e descobriu que o primogênito não era seu.

Para dar continuidade ao caso, a Justiça austríaca determinou exames de paternidade nos outros três filhos, que também não apresentaram resultados positivos.

A vítima da infidelidade passou a exigir de sua ex-mulher o pagamento de 72 mil euros de indenização. A quantia estipulada pelo austríaco seria para cobrir os custos dos brinquedos, formação escolar, férias e outros custos durante o tempo que conviveu com a mulher.

Para o jornal austríaco, o homem propõe que todos os pais façam testes de paternidade durante o primeiro ano de vida de seus filhos, já que só assim será possível evitar casos como esse.

Fonte: Terra

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